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Por que o Brasil não tem uma frota própria de aviões de combate a incêndio? 3kr6h

Foto: DepositPhotos

ANÁLISE E OPINIÃO – Em uma das piores semanas de queimadas e incêndios florestais no Brasil, uma pergunta óbvia tem sido feita: por que não se têm grandes aviões de combate ao fogo no país, a exemplo de outros países, inclusive da América do Sul, como Chile e Argentina? 56ys

A ação aérea de combate ao fogo em áreas abertas é uma das mais eficientes maneiras de controlar grandes incêndios, principalmente em áreas de floresta e zonas rurais. Porém, no Brasil, se vê um uso limitado de aeronaves nesta função.

Toda a ação dos chamados “Bombeiros do Ar” normalmente é feita por helicópteros Airbus H125 Esquilo ou similares com o chamado bambi bucket, que é uma bolsa que pode ser enchida em lagos ou piscinas com o helicóptero em voo, ou é feita com aeronaves agrícolas que usam seu sistema de alijamento rápido para jogar água.

O maior avião que se vê em ação atualmente no país é o Embraer KC-390 da FAB com kit MAFFS, que permite combate ao fogo, seguindo a herança do C-130 Hércules. Porém, ambas as aeronaves são jatos cargueiros militares, não são projetos para esta função, assim como os aviões agrícolas AirTractor ou os Esquilos dos bombeiros estaduais.

Estas limitações, junto com o fato de que são aeronaves que precisam ser retiradas das suas funções ordinárias para combate ao fogo, acabam atrapalhando em muito o combate ao incêndio.

DESORGANIZAÇÃO DO ESTADO – No que pode ser considerada uma desorganização do governo brasileiro, em todos os níveis, os aviões atuam de maneira separada, com cada serviço de bombeiro estadual fazendo seus próprios contratos e combate. Em contraste, países próximos e distantes já fazem isso de maneira mais organizada.

Nos EUA, existe a CALFIRE, que é o Departamento Florestal e de Proteção de Incêndios da Califórnia. Neste órgão, existe uma frota dedicada completamente ao combate à incêndio, atuando em coordenação com os bombeiros de cada cidade e condado, além de empresas privadas contratadas e meios aéreos das Guardas Aéreas Nacionais, que também chegam a ter esquadrões de Hércules para esta função.

Tudo isso é organizado em bases aéreas dedicadas ao combate ao fogo. No Canadá, a situação é parecida, e existe um intercâmbio entre os dois países para o combate, até porque o fogo e a fumaça não respeitam fronteiras, e principalmente na costa oeste costuma ir de um país para o outro.

Na Europa, a situação é similar, com equipes governamentais dedicadas em Portugal, Espanha, França e Itália, operando aviões canadenses Canadair CL-215/415, construídos para esta função. Os portugueses inclusive compraram mais deste avião, mas só receberão em 2028, dado à grande fila de espera, dado que a fábrica foi reaberta 2 anos atrás.

Cockpit do Hércules da RAAF em combate ao fogo – Divulgação

Já na Rússia, o combate é feito por aviões IL-76 com sistemas similares ao MAFFS, além do jato dedicado Beriev Be-200. Todo este aparato é coordenado pelo Ministério de Emergências, que é uma Defesa Civil a nível nacional e com financiamento federal.

Outro país que tem se destacado é a Austrália, que além do uso de aviões militares Hércules da RAAF, a Real Força Aérea da Austrália, o governo federal e estadual tem contratos fixos com empresas privadas americanas especializadas, tanto para helicópteros como aviões, para serviço na chamada “Fire Season”, que é a temporada de fogo, que é exatamente o que o Brasil sempre a no final do inverno.

Inclusive, o Brasil nota esse movimento, com a constante agem de aviões Air Tractor por Recife e Belo Horizonte, nos translados dos aviões que vêm da Espanha para um contrato de Fire Season no Chile. Já a Argentina, conta com um Boeing 737 dedicado para isso.

Ainda assim, o Brasil ainda acredita que a simples prevenção poderá evitar o incêndio, e não faz investimentos adequados ou permita que isso aconteça. Após muitos anos, foi regulamentada a questão do uso de aviões estrangeiros com tripulações estrangeiras para combate a fogo, mas por enquanto ficou apenas na de uma Medida Provisória, sem nenhuma atitude concreta anunciada ou realizada.

Divulgação – Coulson

Como tudo que é bem feito exige investimento e comprometimento, não como um plano de governo, mas sim de nação, apenas contar com e se apoiar na FAB, que inclusive não tem como função por lei combater incêndios, é um erro grave que se repete por décadas.

A Força Aérea Brasileira não tem orçamento dedicado para esta função e muito menos aeronaves. Formar um esquadrão dedicado não exigiria apenas um orçamento maior, mas também uma linha de atuação, já que os incêndios acontecem em torno de 4 dos 12 meses do ano.

Países estrangeiros usam contratos com empresas estrangeiras exatamente para não terem “prejuízo” na ociosidade, ou fazem parcerias com outras nações para reduzir a subutilização.

Este fato se repete no combate à dengue, que no exterior é amplamente feito com aviões de pulverização, mas as leis brasileiras proíbem, enquanto muitos congressistas consideram um ato criminoso o simples uso de aviões agrícolas em qualquer função.

Aparentemente, o uso de equipamento não governamental seria um atestado de incompetência na visão de muitos gestores públicos, que usam e abusam de compra de equipamentos de serviço público para campanhas políticas, sem focar na aplicabilidade do mesmo.

No final, o país não possui tais aeronaves nativas para combate ao incêndio por uma cultura extremamente atrasada, sem foco na solução do problema e apenas em paliativos, além de ser baseada em discursos ambientalistas rasos, sem olhar seus pares internacionais.

É necessária uma atitude forte e sem tolerância por parte da população para que se possa criar uma cultura de que o combate é tão importante quanto a prevenção. Sem essa conscientização, o Brasil continuará a ser o 5º maior país do mundo, e o único entre os 6 maiores a não ter se quer um avião ou helicóptero próprio de combate ao incêndio.